As recentes mudanças efectuadas pelo PR JOÃO LOURENÇO (JL) na estrutura central do MPLA foram interpretadas em meios partidários como um saneamento de correntes que se assumiram como desalinhadas da sua agenda voltada para o próximo Congresso, previsto para 2026. JL deverá deixar o poder dentro de três anos, quando concluir os dois mandatos previstos pela Constituição.

JORNAL FAX

Segundo Africamonitor, apesar de não ter debatido internamente o seu futuro político, JL remete para 2027 qualquer decisão sobre um eventual terceiro mandato.

A posição é vista como reveladora da sua vontade pessoal de permanecer no poder, embora esteja consciente de que não possui condições constitucionais nem apoio dentro do próprio partido ou da sociedade, que passou a contestá-lo.

Forçar um terceiro mandato seria também prejudicial para sua imagem externa, a nível regional e junto dos países ocidentais.

Os sinais de que gostaria de permanecer no poder começaram a ser evidenciados com clareza em AGO.2021, durante a cerimónia de inauguração do Polo de Desenvolvimento de Saurimo, quando defendeu que 10 anos, período constitucionalmente previsto para dois mandatos, são insuficientes para o seu projecto de reformas o país e que cumpriu as suas promessas eleitorais.

 Conforme apurado, diante das limitações constitucionais JL mostra-se determinado a controlar o próximo Congresso do MPLA para forçar uma de duas vias:

a) Impor como próximo líder alguém da sua confiança;

b) Concorrer ele próprio à presidência do partido, mas indicando um candidato para concorrer nas eleições gerais de 2027, à semelhança do que fez JOSÉ EDUARDO dos SANTOS (JES) em 2017.

Para esta segunda solução há a convicção em meios afectos ao líder de que JL necessitaria de um Congresso sem candidaturas rivais.

A impopularidade de JL apresenta “tendências” de crescente erosão, que meios com especial capacidade de observação da política interna descrevem como proporcionais a novos agravamentos de aspectos da situação do país com potencial para afectar ainda mais as já precárias condições de vida de vastas camadas da população.

A animosidade contra JL espontaneamente manifestada em largos estratos da população urbana, Luanda em especial, atingiu já uma intensidade e/ou virulência a que outros sectores da sociedade deixaram de ser indiferentes – incluindo a própria “nomenklatura” do MPLA (AM 1439).

A radicalização pela qual está a passar o clima de segurança no país é igualmente visto como “afloramento” da consciência que JL e aqueles que o rodeiam, em especial o chefe do SINSE, FERNANDO MIALA (FM), têm da impopularidade do PR, suas características e riscos de segurança.

A contestação de que FM é alvo no regime apresenta aspectos considerados “delicados” por JL, entre os quais o de envolver figuras da sua máxima confiança e que se manifestam com o alegado propósito de o defender, por verem no mesmo um potencial “traidor” (AM 1432).

O ex-secretário para informação do MPLA, RUI FALCÃO (RF) agora afastado da função de porta-voz do partido, afirmou em JAN. que internamente no partido não se discutiu a questão da continuidade de JL, defendendo um Congresso com múltiplas candidaturas, contrariando os planos do PR de controlar o partido após o Congresso de 2026.

RF vinha também assumindo a situação de dificuldade da população e até a fome. A posição distanciou-se da de JL, que em reuniões internas do MPLA reage com irritação a menções sobre a fome no país.

 Oriundo de uma família histórica – com destaque para o primeiro presidente do MPLA, MÁRIO PINTO de ANDRADE – RF é bastante respeitado internamente pelas suas posições autónomas. O PR nomeou-o agora ministro da Juventude e Desporto, posição que o mantém distante do principal centro de decisão política do partido, o Bureau Político (BP).

RF foi substituído por ESTEVES CARLOS HILÁRIO (ECH), um jurista com uma postura mais submissa perante JL. ECH deverá defender a agenda de JL sem levantar questões, dada a necessidade de manifestar lealdade e gratidão ao PR, que o fez ascender ao BP. ECH tem menos de 10 anos de militância activa e o seu falecido pai, PEDRO HILÁRIO ANTÓNIO, foi deputado pela bancada parlamentar da UNITA na primeira legislatura.

Formou-se em Direito, tendo estudado no Brasil, e trabalhou como director do Gabinete Jurídico e de Intercâmbio do Governo Provincial de Luanda, cargo que deixou após um afastamento não pacífico pela antiga governadora provincial, ANA PAULA CHANTRE LUNA de CARVALHO. Sobre ele recaíram suspeitas na gestão da concessão de direitos de superfície.

VIRGÍLIO FONTES PEREIRA (VFP), igualmente afastado no seguimento do saneamento interno, é conotado com a corrente opositora a uma eventual continuidade de JL. Ainda no tempo de JES, VFP chefiou a bancada parlamentar do MPLA, cargo que deixou a seu pedido quando JL se tornou PR. Em finais de 2018, retomou o seu assento no parlamento, e dois anos depois voltou a liderar o grupo parlamentar.

 VFP também é dado como opositor da ideia de uma alteração da Constituição, dado que a mesma sofreu mudanças pontuais há menos de dois anos. JL indicou como novo presidente do grupo parlamentar JOAQUIM ANTÓNIO CARLOS dos REIS JÚNIOR (JRJ), até recentemente vice-presidente da bancada parlamentar.

Jurista e Cor. na reforma, JRJ é um antigo membro do Departamento de Defesa e Segurança do MPLA e igualmente antigo PCA da empresa GEFI, o braço empresarial do partido. Foi secretário do Conselho de Ministros do governo de JES entre 2004-2010.

Em finais de 2022, o JL manifestou a sua abertura para iniciar discussões com os partidos da oposição sobre possíveis alterações à Constituição. A UNITA declarou então estar disposta a participar nas discussões, desde que as mesmas não incluíssem qualquer alteração ao limite de dois mandatos presidenciais.

O PRS e a CASA-CE, também manifestaram a sua disponibilidade para participar nas discussões, mas com diferentes pontos de vista sobre as alterações que consideram necessárias.

O debate sobre um eventual terceiro mandato de JL divide o MPLA, havendo ao nível das bases e da maioria dos parlamentares forte oposição à ideia. No entanto, um pequeno grupo liderado pelo Gen. JOSÉ TAVARES FERREIRA e apoiado por MÁRIO DURÃO defende a iniciativa. Desde ABR.2020, também algumas figuras a nível provincial têm-se assumido como defensoras do “terceiro mandato”, caso de ANTÓNIO MUSSUMARI, administrador municipal do Lôvua, e membro do Comité Provincial do MPLA na Lunda-Norte.

Em oposição a esta corrente, está o histórico do partido JULIÃO MATEUS PAULO (“Dino Matross”), que desaconselhou publicamente JL a não procurar um terceiro mandato presidencial.

O antigo SG e agora membro do conselho de honra do Presidente do MPLA, afirmou-se contra a alteração e sublinhou que o partido não possui o número suficiente de deputados para aprovar uma emenda constitucional nesse sentido. Conhecido por não lidar bem com críticas, JL chamou “Dino Matross” ao Palácio Presidencial no final do ano passado para mostrar desagrado acerca da posição que o antigo SG assumia em relação à sua pessoa, em público e em meios reservados.

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