De um tempo a essa parte, isto é, desde abertura do concurso acima referenciado, tenho estado a receber várias preocupações de docentes de Direito Administrativo, Especialistas de Recursos Humanos da Administração Pública, Direito da Função Pública e outras entidades muito bem abalizadas na matéria de Recrutamento e Selecção de Pessoal na Administração Pública, nomeadamente, Magistrados, Funcionários antigos etc.

EMÍLIO QUAQUARTA (JURISTA)

As preocupações, dizem respeito a modalidade escolhida para o referido concurso, avaliação documental ao invés da prova escrita que é a regra, por força da Lei de Bases da Função Publica, conjugado com o novo regime de recrutamento e selecção de pessoal na Administração Pública, aprovado pelo Decreto Presidencial n.º 112/24, de 17 de Maio.

Mesmo já tendo feito algum estudo sobre a matéria, no dia 17 de Dezembro de 2025, tomei conhecimento por intermédio dos portais que o Plenário do Conselho Superior da Magistratura Judicial, anulou o referido concurso por irregularidades procedimentais, nos termos dos n.ºs 2 e 5 do artigo 4.º das Carreiras do Regime Especial dos Oficiais de Justiça, aprovado pelo Decreto Presidencial n.º 136/17, de 20 de Junho, aplicável por força do n.º 3 do artigo 40.º da Lei n.º 4/22, de 17 de Março – Lei das Secretarias Judiciais e Administrativas, e em consequência, foi declarado nulo e promovido a abertura de um novo concurso, conforme Resolução saída da 12.ª Sessão Ordinária do Plenário do Conselho Superior da Magistratura Judicial, de 17 de Dezembro de 2025.

E tenho estado a acompanhar as diversas reações nas redes sociais sobre a decisão tomada pelo Conselho, sendo certo que uns estão a reclamar, porque supostamente já tinham sido admitidos e consideravam-se já Funcionários Judiciais, como o caso da matéria publicada num dos portais, com o título “Funcionários Judiciais dos Tribunais da Jurisdição Comum exigem reapreciação imediata do concurso público”, outros sugeriram que deviam introduzir a prova escritas aos candidatos admitidos e ainda existem uns tantos, aplaudiram a medida, visando garantir a transparência e lisura de todo processo.

Em face dessas e outras preocupações sobre o tema, exponho aqui e muito resumidamente o estudo que fiz, com objectivo de ajudar a esclarecer todos interessados, aproveitando pedir desculpas pelos eventuais erros ortográficos ou de concordância no texto, visto que ele foi escrito num contexto de festas.

Por força do Art.º 34.º da Lei n.º 26/22, de 26 de Agosto – Lei de Bases da Função Pública, adiante designada por LBFP, a admissão de pessoal na Função Pública, obedece a realização de concurso público e deve ser o mais simplificado possível, objectivo e transparente, sendo nulo o provimento para o quadro definitivo da Função Pública, sem concurso publico.

Os concursos podem ser de ingresso ou de acesso (Art.º 36.º da LBFP). O concurso de ingresso visa o preenchimento de vaga para a categoria de início da carreira, e pode ser interno ou externo. E interno quando aberto a funcionárias públicos do quadro definitivo do órgão, organismo ou serviço a que diz respeito o concurso, que tenham elevado os seus níveis académicos no decurso da actividade laboral. É externo publicado aberto a cidadãos que não possuem vínculo definitivo com a Função Pública e aqueles que, possuindo vínculo definitivo, não fazem parte do órgão, organismo ou serviço que promove o concurso público. O regime de ingresso para o pessoal de carreira do regime especial é estabelecido por acto normativo específico (Art.º 37.º da LBFP). No âmbito do regime especial dos Oficiais de Justiça (Funcionários Judiciais), ainda é aplicável o Decreto Presidencial n.º 136/17, de 20 de Junho, que aprova as Carreiras do Regime Especial dos Oficiais de Justiça, aplicável por força artigo 40.º da Lei n.º 4/22, de 17 de Março – Lei das Secretarias Judiciais e Administrativas.

Com base na Lei de Bases da Função Pública, aplicável aos Tribunais nos termos do artigo 2.º n.º, 2 do referido diploma, foi regulamentado os procedimentos sobre o recrutamento e seleção de pessoal na Administração Pública, pelo Decreto Presidencial n.º 112/24, de 17 de Maio, visando garantir maior transparência, rigor, imparcialidade e credibilidade no processo de recrutamento e selecção de pessoal na Administração Pública.

Conforme acima reportado, os concursos públicos são de ingresso e acesso. O de ingresso pode ser interno ou externo. O artigo 23.º, n.ºs 1 e 2, do Decreto Presidencial n.º 112/24, de 17 de Maio, quanto as modalidades de avaliação, diz o seguinte:

1. A prova escrita constitui a regra nos Concursos de Ingresso Externo.

2. Nos Concursos de Ingresso Interno e de Acesso, sempre que se justifique, é utilizada a prova escrita como método eliminatório quando o número de candidatos é superior ao número de vagas, ou a avaliação documental como método eliminatório de avaliação quando o número de vagas é igual ou superior ao número de candidatos.

O disposto nos números supracitado, facilmente consegue-se absorver que a prova escrita constitui a regra nos Concursos de Ingresso Externo, como no caso do Concurso em curso no Conselho Superior da Magistratura Judicial 2025 para ingresso de Funcionários Judiciais nos Tribunais de 1.ª Instância, sendo para Concurso de Ingresso Interno (transição) ou de Acesso (promoção), quando o número de candidatos for superior ao número de vagas, caso contrário, será avaliação documental, isto é, quando o número de candidatos for igual ou inferior ao numero de vagas, conforme ainda se pode extrair dos artigos 18.º, 20.º, 23.º, Decreto Presidencial n.º 112/24, de 17 de Maio.

Pelo descrito acima a utilização da modalidade avaliação documental se mostra a todos títulos ilegal, inconstitucional e até mesmo imprópria (abusiva) para o referido Concurso Público de Ingresso Externo 2025, por violar os princípios da legalidade, da divulgação dos métodos e provas a utilizar e o respectivo sistema de classificação, da objectividade dos métodos de avaliação, do rigor, da transparência e da concorrência leal e justa, todos previstos no artigo 35.º da LBFP, conjugado com o artigo 3.º do Decreto Presidencial n.º 112/24, de 17 de Maio, e em consequência, deve ser anulado, sem prejuízo de alguns actos praticados no referido concurso, serem aproveitados no novo concurso, como é o caso dos candidatos já admitidos a concorrer.

Assim sendo, penso que andou bem o Plenário do Conselho Superior da Magistratura Judicial em anular o referido concurso e preparar o novo concurso, com a introdução da prova escrita, atendendo que a irregularidade procedimental apurada, derivou do Despacho que procedeu abertura do Concurso, com a introdução da avaliação documental, ao invés da prova escrita, aplicável para este tipo de concurso.

Importa salientar que o concurso ora anulado, foi aberto mediante Despacho n.º 132/CSMJ/2025, de 18 de Junho, nos termos do artigo 12.º, n.º 1 do Decreto Presidencial n.º 112/24, de 17 de Maio – (Que Estabelece os Procedimentos a observar no Recrutamento e Selecção de Candidatos na Administração Pública). O aviso de abertura do concurso publico externo foi publicado no dia 20 de Junho de 2025 no Jornal de Angola, bem como no website do Conselho, nos termos do artigo 12.º, n.º 2 e 3 do Decreto Presidencial n.º 112/24, de 17 de Maio.

Foram inscritos mais de 20.000,00 candidatos, durante o período de 15 (quinze) dias, termos do artigo 15.º, n.º 1 do Decreto Presidencial n.º 112/24, de 17 de Maio. Foi publicada no website do Conselho, as listas provisórias dos candidatos admitidos e excluídos a concorrer no dia 31 de Agosto de 2025, nos termos do artigo 22.º do Decreto Presidencial n.º 112/24, de 17 de Maio. Os candidatos tiveram o direito de 5 dias para reclamar, termos do artigo 21.º, n.º 2 e 3 do Decreto Presidencial n.º 112/24, de 17 de Maio e até a presente data, não foi publicada a lista final definitiva dos candidatos admitidos a concorrer.

Logo não assiste razões de fundo para eventuais reclamações dos candidatos admitidos provisoriamente a concorrer, tendo em conta que a fase em que o mesmo foi anulado, faltavam as etapas mais relevantes do concurso, nomeadamente:

a) Publicação da lista final dos candidatos admitidos ao exame, constando os tópicos dos conteúdos a serem avaliados, indicação da data, hora e local da prova;

b) Aplicação das provas escritas;

c) Correcção das provas;

d) Publicação da lista provisória de classificação final, com a indicação do período de reclamações;

e) Publicação da lista definitiva de classificação final com a respectiva ordem de provimento.

Nestes termos, devem os interessados aguardar pacientemente a abertura do novo concurso, começando desde já, a prepararem-se para prova escrita, estudando materiais ligadas a organização judiciária do País, principais actividades exercidas pelos Funcionários Judiciais, língua portuguesa, cultura geral, etc.

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