Dando seguimento às denúncias feitas por Garcia Tomás, ou simplesmente, Bispo Abraão, ex-inspector geral da Igreja de Comunhão Cristã de Angola (ICCA), vêm agora à tona novos elementos que, segundo ele, revelam uma rede de corrupção e favorecimento dentro da liderança da igreja, alegadamente liderada pelo Bispo Antunes Huambo.
Segundo o denunciante, práticas como venda de cargos, extorsão aos fiéis, abertura de contas bancárias paralelas e falsificação de documentos seriam recorrentes nos bastidores da instituição religiosa.
VENDA DE CARGOS E USO DA IGREJA COMO FACHADA PARA NEGÓCIOS
Bispo Abrão afirma que o Apostolo Wala Faria, o Evangelista Fernandes Neves (director do Gabinete do Presidente) e o Reverendo Paulo Mukesse teriam burlado uma senhora, ao simularem um processo de obtenção de passaportes. Segundo ele, o grupo utilizava a igreja como se fosse uma “agência de viagens” para facilitar negócios pessoais.
“Soube que o apóstolo Wala afirmou ter entregue 200 mil kwanzas à igreja em troca de um cargo na direcção central. Quando confrontei o Bispo Huambo, ele tentou desmentir. Mas isso é inaceitável – ninguém deve pagar para obter cargos numa estrutura eclesiástica”, denunciou.
EXTORSÃO E AUMENTO DE PREÇOS SEM JUSTIFICATIVA
Ainda de acordo com o ex-bispo, os fiéis têm sido alvo de extorsão sistemática. A título de exemplo, citou o caso do documento de comparticipação de despesas, que antes custava 2 mil kwanzas, mas que, por decisão unilateral de Antunes Huambo, passou a ser vendido por 6 mil kwanzas.
“Temos ministérios com mais de 100 locais de culto. Com esse novo preço, são recolhidos milhões sem qualquer explicação clara sobre o destino dos valores. Além disso, fiéis fazem pagamentos para obtenção de documentos e credenciais que até hoje não foram entregues”, relatou.
DESCOBERTA DE CONTA BANCÁRIA PARALELA NO CUNENE
Durante sua gestão no BCI, Bispo Abrão afirma ter descoberto a abertura de uma nova conta corrente da igreja na província do Cunene, sem o conhecimento da maioria dos dirigentes. A conta estaria em nome da igreja, com assinatura do Bispo Huambo, e recebia depósitos direitos dos pastores presidentes.
“Informei o presidente da existência dessa conta e ele me mandou ‘tratar do assunto’. Mas até hoje não sabemos quem abriu, com que autorização, nem para onde vai o dinheiro. Isso levanta sérias dúvidas sobre a gestão financeira da igreja”, afirmou.
FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTOS PARA MISSIONÁRIOS ESTRANGEIROS
Garcia Tomás também revelou um episódio relacionado à falsificação de documentos para missionários estrangeiros. Segundo ele, o director do gabinete do presidente teria falsificado uma carta dirigida ao Instituto Nacional para os Assuntos Religiosos (INAR), alegadamente para facilitar a entrada de missionários vindos dos Estados Unidos.
“Quando descobriram a falsificação, ligaram para mim a perguntar se eu tinha conhecimento da carta. Neguei, e sugeri irmos ao INAR verificar quem a entregou. Foi aí que pressionaram o colaborador do gabinete, e este, junto com o Reverendo Orlando, confessou a autoria do documento”, explicou.

ROUBO INTERNO E SUSPEITAS NÃO INVESTIGADAS
Em outro momento, Abrãao menciona um roubo ocorrido no gabinete da presidência. Após investigação do SIC (Serviço de Investigação Criminal), imagens de videovigilância indicariam que o único acesso ao local durante a noite do roubo foi feito por dois indivíduos: o irmão do presidente e um membro do gabinete de Antunes Huambo. Apesar disso, nenhuma providência teria sido tomada.
“Mesmo diante dessas evidências, essas pessoas continuam a ser protegidas e ocupam cargos de liderança. Isso mostra como a estrutura está comprometida”, disse o ex-inspector.
DISPOSIÇÃO PARA JUSTIÇA E DIÁLOGO
Garcia Tomás afirma que está preparado para levar o caso à justiça e ao INAR, mas reitera que está aberto ao diálogo, desde que a sua imagem seja limpa perante os fiéis.
“Quero que a igreja saiba que não sou aquilo que andam a dizer de mim. Não tenho nada a esconder. Se houver provas de que cometi erros, estou disposto a responder por eles na justiça. Mas não aceito ser vítima de uma campanha de difamação orquestrada por quem quer esconder os verdadeiros problemas da igreja”, declarou.
Segundo ele, tudo começou quando começou a fazer advertências internas sobre irregularidades na gestão da ICCA. “Fui afastado dos cargos em desacordo com os estatutos, simplesmente por questionar o sistema. Denunciar virou um risco”, lamentou.
CONTRADITÓRIO: SILÊNCIO DA ICCA E TENTATIVA CONTÍNUA DO JORNAL PARA OUVIR A IGREJA
Partindo do princípio do contraditório, o Jornal HORA H tentou contactar o líder da Igreja de Igreja de Comunhão Cristã de Angola (ICCA), Antunes Huambo, mas sem sucesso. O responsável não atendeu às chamadas nem respondeu às mensagens enviadas, após a publicação de um trecho relacionado à denúncia o líder da ICCA orientou o seu vice a estabelecer contacto com a direcção deste órgão de comunicação e garantiu a sua presença nas nossas instalações para prestar esclarecimentos.
Na data combinada, recebemos na redacção, dois representantes da igreja, entre os quais António Caquenda, director do Gabinete de Comunicação da ICCA. No entanto, este recusou-se a prestar declarações e limitou-se a entregar um documento a solicitar a eliminação do conteúdo publicado no prazo de 24 horas, além de impedir a publicação da matéria na íntegra.
Na tentativa contínua de garantir o contraditório, o Jornal HORA H aguardou mais sete dias, mantendo contactos com a direcção da igreja. Durante este período, a resposta recebida foi de que estavam a negociar com o denunciante e que se pronunciariam em breve. Contudo, após mais oito dias, não houve qualquer posicionamento oficial.
No dia 4 de Agosto, segunda-feira, entrámos novamente em contacto com a direcção de comunicação da ICCA. Desta vez, foi-nos informado que poderíamos dar seguimento à matéria sem o contraditório, alegando que a instituição não pretende “dar asas à denúncia”.