O desaparecimento da propensão antes revelada pela ministra das Finanças, Vera Daves (VD), para fazer reparos públicos a aspectos da política financeira do governo, com os quais estaria em desacordo, é atribuído a pressões que teriam sido exercidas sobre ela, segundo o Africa Monitor.

Essas pressões são justificadas por considerações de que tal postura não seria adequada para um membro do governo e alto dirigente do MPLA.

Um dos pontos críticos levantados por VD foi a predominância da modalidade de ajuste direto (ou contratação simplificada) na contratação pública. Essa prática, cuja decisão é de competência exclusiva do Presidente da República (PR), teria gerado especulações de que os reparos de VD incomodaram especialmente João Lourenço (JL), levando-o a admoestar a ministra.

INDEPENDÊNCIA DE VD e REAÇÕES POLÍTICAS

A atitude de VD foi associada, em meios de oposição e na sociedade, à independência de pensamento e desassombro político, chegando a levantar interpretações sobre eventuais ambições políticas. Sua relativa juventude, reputação de competência, naturalidade e descontração contribuíram para a percepção de que estaria afirmando um espaço político próprio.

VD, formada em Economia pela Universidade Católica de Angola, iniciou sua carreira no Banco Atlântico e ganhou destaque como comentadora de assuntos econômicos na RNA. Foi convidada pelo então ministro das Finanças, Archer Mangueira, para ser administradora da Comissão de Mercado de Capitais (CMM), e depois secretária de Estado das Finanças e Tesouro. Em 2019, substituiu o próprio ministro.

MOTIVOS PARA O SILÊNCIO DE VD

A discrição adotada por VD tem sido atribuída a fatores políticos ou de carreira, especialmente devido à grave situação financeira do país. Alguns dos desafios incluem:

Prevalência do ajuste direto: Representa 99% do valor dos contratos públicos em 2023, três vezes mais que em 2022. As empresas beneficiadas são frequentemente associadas à superestrutura política, incluindo JL.

Crédito externo: Recorrido para suprir necessidades básicas do Tesouro, como pagamento de dívidas e salários, sem investimentos relevantes.

Compliance mais rígido: Bancos em Angola enfrentam regras mais rigorosas devido a suspeitas de lavagem de dinheiro, colocando o país novamente na lista cinzenta do GAFI (Grupo de Ação Financeira Internacional).

Atrasos nos salários públicos: Frequentemente atrasados, em contradição com declarações de VD sobre a sustentabilidade das receitas tributárias.

CRÍTICAS AO AJUSTE DIRETO

A contratação por ajuste direto, justificada pela rapidez na execução de projetos, tem sido criticada por:

Transformar-se em regra, quando deveria ser exceção.

Beneficiar empresas associadas a oligarquias políticas.

Exigir cativação imediata de verbas pelo Banco Nacional de Angola (BNA), complicando a gestão do Tesouro.

OUTROS PROBLEMAS ECONÔMICOS

Inflação: Permanece acima de 30% a nível nacional e 40% em Luanda, o nível mais alto desde 2016.

Desvalorização do kwanza (AOA): Agrava a inflação e as condições de vida, com alta nos preços de produtos alimentares e não alimentares.

Escassez de divisas: O mercado cambial enfrenta desequilíbrios significativos, mantendo uma diferença de 30-35% entre as taxas oficiais e paralelas.

Apesar de esforços, como vendas de divisas pelo Tesouro no terceiro trimestre (USD 1,1 bilhão), os problemas persistem, prejudicando a economia e o setor social. As medidas do BNA são consideradas insuficientes para lidar com a pressão sobre o kwanza e a inflação.

A situação financeira de Angola segue complicada, com desafios significativos para o governo e a ministra das Finanças.

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